Não obstante ao golpe que o nosso sistema político sofreu recentemente, há outro ainda mais tenebroso: o previdenciário. A recente extinção do Ministério da Previdência e Assistência Social, que foi transferido ao Ministério da Fazenda, assim como a tentativa de reforma da Previdência Social fazem parte do plano neoliberal que intende transferir a maior parte do orçamento às camadas mais ricas da sociedade – além de tratar a própria vida sob a ótica da contabilidade e da fiscalidade.

Em primeiro lugar, a reforma proposta pelo interino Michel Temer e seu ministro da Fazenda, Henrique Meirelles não tem como objetivo aperfeiçoar o sistema previdenciário e, sim, destruir a proteção social conquistada na Constituição de 1988. De acordo com o IBGE, entre 1980 e 2015 a taxa de fecundidade caiu de 4,1 para 1,7 filhos nascidos vivos por mulher, sendo que a expectativa de vida passou de 62,6 para 75,4 anos, indicando, assim, o progressivo envelhecimento populacional, tornando a previdência uma ferramenta extremamente necessária para a construção de uma democracia digna.

Por outro lado, existe ainda a falácia de que a Previdência Social trouxe um déficit junto ao rombo fiscal, um dos motes do golpe à presidenta Dilma Rousseff. Desde o início, o financiamento previdenciário segue o modelo clássico tripartite, em que contribuem tanto os empresários quanto os trabalhadores e o governo. No entanto, é um erro contabilizar apenas receitas de contribuições e despesas com benefícios, como fizeram com os dados divulgados pelo Tesouro Nacional ao Correio Braziliense. A Previdência tem outras fontes de recursos que a tornam superavitária, como a parte do governo que integra o modelo tripartite e a qual é considerada um “déficit” por propagandistas neoliberais.

OS FUROS DA REFORMA

 O fim da regra que estabelece que a Previdência Social não pode pagar benefícios com valores inferiores a um salário mínimo é uma das propostas do governo interino na reforma previdenciária, medida essa que se compara às práticas da ditadura civil-militar na qual o poder de consumo dos aposentados foi praticamente aniquilado. Outro item é a elevação da idade mínima de 60 para 65 anos de idade e de 30 para 35 anos de contribuição, enquanto que países que fizeram modificações semelhantes demoraram cerca de 20 anos até que a lei vigorasse. Caso a medida seja aprovada, o Brasil será um dos campeões mundiais na exigência da aposentadoria.

A mudança na idade mínima tanto para homens quanto para mulheres, que atualmente difere-se em 5 anos tanto em idade quanto em contribuição, também é um bocado desigual, dado que a sociedade brasileira ainda é muito machista e a maioria dos casais não compartilha o serviço doméstico. Enquanto que, de acordo com dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) do IBGE de 2014, mulheres passam 24 horas por semana ocupadas com afazeres domésticos, homens passam uma média de 10,5 horas/semana.

Outra falha brusca nas propostas de reforma está na previdência de trabalhadores rurais – ao aumentar a idade mínima, ignora-se completamente a heterogeneidade da zona rural brasileira. A zona rural do Nordeste do país, por exemplo, é onde se concentra 70% da pobreza extrema do país. Há também a proposta em transformar a previdência social rural em apenas um benefício da assistência social, o que corre o risco de ser uma contribuição abaixo do piso do salário mínimo sem regras para definição monetária.

Ao invés de adotar medidas efetivas, como uma revisão radical da política de isenção fiscal para setores econômicos e famílias de alta renda; o combate da sonegação de impostos que, de acordo com o Banco Mundial chega a R$860bi anuais e a promoção de uma reforma tributária que elabore um sistema que cobre de forma justa os lucros, dividendos, latifúndios, grandes fortunas e patrimônios, o ministro da Fazenda Henrique Meirelles prefere afirmar erroneamente que o direito adquirido proposto pela Previdência seria “um conceito impreciso” e que precisa ser revisto.

 

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